Comunidades do Pedral do Lourenço querem ser ouvidas sobre hidrovia Araguaia-Tocantins

Ministério Público Federal se reuniu com representantes no evento "Pedral do Lourenço" na terra da Cop-30

“Existe comunidade tradicional no território do Pedral do Lourenço: nós estamos aqui. O Pedral do Lourenção somos nós. Nós somos o rio e, se mexer com o rio, se destruir o Pedral, eles vão estar destruindo as nossas vidas”. Com essas palavras, a liderança comunitária Eva Moraes resumiu um dos principais pedidos do Ministério Público Federal (MPF) e das comunidades tradicionais que podem ser impactadas pela obra da hidrovia Araguaia-Tocantins, no Pará: que o Poder Judiciário reconheça que essas comunidades tradicionais existem e que, portanto, têm direito à Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI), conforme prevê a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A reivindicação do direito de que comunidades ribeirinhas, quilombolas e indígenas não sejam invisibilizadas foi repetida por diversas outras lideranças comunitárias que participaram do seminário “Pedral do Lourenço na Terra da COP 30”, realizado nos últimos dias 4 e 5 de abril, nas comunidades ribeirinhas extrativistas das vilas Tauiry, em Itupiranga, e Praialta, em Nova Ipixuna, no sudeste do Pará. Promovido por uma rede de organizações, o evento contou com a presença do MPF, que foi representado pelo procurador da República Rafael Martins da Silva e pelo procurador regional da República Felício Pontes Jr. e suas equipes.

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O procurador da República Rafael Martins da Silva destaca que o MPF considera muito preocupante, nessa obra, os impactos à atividade pesqueira, “porque o próprio empreendedor da hidrovia, o Dnit [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes], reconhece que essa atividade será impactada e que há necessidade de novos estudos para compreender os impactos que serão levados a essas pessoas. Nesse sentido, se há uma compreensão de que os estudos ainda não estão completos, que há necessidade de complementar esses estudos, o MPF considera impossível a liberação de qualquer licença e a autorização para a realização de qualquer atividade relativa a essa obra”, frisa.

Inviabilidade jurídica

“Mostramos para as comunidades que, do ponto de vista jurídico, não há possibilidade de ser emitida a licença para a obra. E pudemos também mostrar que a decisão judicial, naquilo que não nos foi favorável, cometia alguns erros, e que nós pedimos, por meio de recurso judicial, que esses erros sejam corrigidos”, explica o procurador regional da República Felício Pontes Jr. A decisão e o recurso fazem parte de processo judicial iniciado por uma ação ajuizada pelo MPF, em agosto do ano passado, com pedidos urgentes para a anulação da licença.

Em fevereiro deste ano, a Justiça atendeu a alguns pedidos e impôs obrigações a órgãos públicos para corrigir e evitar ilegalidades no licenciamento, mas nem todos os pedidos do MPF foram acolhidos. Em seguida, o MPF apresentou recursos para reforçar, entre outras demandas, a necessidade de que o Poder Judiciário leve em consideração todas as comunidades tradicionais.

“Esse seminário realizado, que foi organizado pelas próprias pessoas que residem ali, servirá como prova, indicativo, de que essas comunidades existem e que elas precisam ser ouvidas para que qualquer obra seja realizada”, enfatiza o procurador da República Rafael Martins da Silva. “Ficamos muito impressionados com a força das comunidades, a resistência das comunidades em relação a esse projeto, porque todos foram unânimes no sentido de que o projeto trará muito mais impactos negativos do que positivos para as comunidades ao longo do rio Tocantins”, complementa o procurador regional da República Felício Pontes Jr.

Balanço do evento

Para a coordenadora de uma das organizações promotoras do evento, o Instituto Zé Cláudio e Maria, Claudelice Santos, o seminário atingiu o objetivo proposto para o evento, que foi o de colocar no centro do debate a hidrovia Araguaia-Tocantins, a partir da perspectiva dos povos e das comunidades que serão atingidas por esse empreendimento. “Ainda há muito o que ser respondido, há muitos estudos ainda a se fazer e não se pode, simples e irresponsavelmente, dizer que essa licença vai ser expedida sem colocar todos os pesos e todas as medidas, principalmente àqueles e àquelas que essencialmente vivem do rio”, pontua.

O coordenador da Associação da Comunidade Ribeirinha Extrativista da Vila Tauiry (Acrevita), Ronaldo Barros Macena, registra que o seminário foi muito importante não só para as comunidades que sediaram o evento, mas também para as demais comunidades de todo o território “desse nosso maravilhoso Rio Tocantins”. “A gente está feliz em ter participado, em ter contribuído para que esse seminário acontecesse junto com o pessoal do Ministério Público Federal. As pessoas que não puderam vir mandaram vídeos de apoio ao nosso seminário. Todos aqueles que participaram ficaram felizes. Então, desde já a gente agradece muito ao Ministério Público Federal, todos os segmentos da sociedade que participaram, todos aqueles que ajudaram direta e indiretamente para que esse seminário, essa nossa luta acontecesse”, agradece.

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