Trabalhadora PCD deve ser indenizada após dispensa discriminatória em Parauapebas

Motorista de veículos pesados em uma mineradora no sul do Pará, a trabalhadora não recebeu condições de trabalho adequadas.

A 1ª Vara do Trabalho de Parauapebas (PA), da Justiça do Trabalho da 8ª Região, condenou uma mineradora que atua no sul do Pará (o nome da empresa não foi divulgado) por dispensa discriminatória, incluindo indenização por danos morais, e ainda, pagamento de adicional de insalubridade após visita técnica ao local. A trabalhadora é pessoa com deficiência (PcD), com surdez unilateral, e, à época da abertura do processo, era contratada como operadora de máquinas de construção civil e mineração.

A juíza substituta Pricila Apicelo, em julgamento, tratou sobre a questão de dispensa discriminatória da trabalhadora utilizando o Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva da Justiça do Trabalho. Ficou constatado que a empresa sabia da deficiência da trabalhadora ao contratá-la, mas se recusou a fazer adaptações no seu ambiente de trabalho por considerar que ela não foi candidata a uma vaga específica para PcD.

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A trabalhadora contou que chegou a pedir a troca de maquinário utilizado, pois, durante os testes para sua contratação o modelo era não prejudicial para sua audição, mas o que passou a usar quando de fato começou o trabalho na mina não era adequado. A comunicação por sinais sonoros para orientação dela como motorista em seu percurso na mina também era inadequado e não houve troca ou ajuste.

Diante da situação, a profissional solicitou transferência para outra vaga na empresa, mas foi informado que não havia vaga em outros setores e ela foi demitida. Após a motorista entrar com o processo na Justiça do Trabalho da 8ª Região, a empresa – antes mesmo da primeira audiência – realizou a recontratação da trabalhadora e a recolocou em um cargo na área administrativa e não mais na área de mina. No processo, de fato, a juíza solicitou que as duas medidas fossem tomadas, e confirmou com a trabalhadora que a empresa já tinha tomado a iniciativa, se antecipando à decisão judicial.

Além disso, a trabalhadora pleiteou o pagamento de adicional de insalubridade pelo tempo que atuou como motorista de veículos pesados na mina e foi de fato constatada a existência de insalubridade em grau médio (20%), devido à exposição ao agente “ruído contínuo e intermitente”, acima do limite de tolerância, sem a devida proteção.

Em sua decisão, a juíza substituta Pricila Apicelo destacou as interseccionalidades do caso, verificando múltiplas vulnerabilidades no caso da trabalhadora. “A autora relatou, no exame ocupacional de 28.03.24, que mora com sua filha de 15 anos. Em sua ficha funcional, consta seu estado civil como separada judicialmente. Ou seja: a autora é mulher, mãe de uma adolescente, PCD e separada. Tal fato enseja aplicação do Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva da Justiça do Trabalho, juntamente com todos os diplomas nacionais e internacionais aplicáveis ao caso”.

O art. 2º da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência estabelece que a discriminação ocorre não apenas pelo dolo, mas, também, pelo resultado de atos que acarretem objetiva inviabilização do acesso a direitos pelas pessoas com deficiência. Nesse sentido, o art. 1º e 2º da Lei Brasileira de Inclusão desfocam a deficiência da pessoa, para as barreiras sociais que PCD enfrentam cotidianamente, para o exercício de direitos em iguais condições com os demais membros da sociedade.

“No caso, a ré deixa claro seu entendimento de que não precisa readaptar sua outrora empregada, pois ‘já possuía outros empregados PCD, já havia preenchido sua cota’. Mais: informa acreditar que não tinha necessidade de adaptar as condições de trabalho da autora, pois ela se candidatou a uma vaga de ampla concorrência. Tais crenças causam profundo espanto, pois a garantia de adaptação razoável é do ser humano PCD e não daquele que consegue êxito em ocupar ‘vagas destinadas a PCD’”, destacou a magistrada diante das afirmações dadas pela empresa de mineração.

A magistrada reforçou que a postura tomada pela empresa violou a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. E destacou a importância do Judiciário nestes casos: “Quando um contrato de experiência é findo em razão de uma falta de adaptação razoável às condições de trabalho de um PCD, cabe ao Poder Judiciário intervir para evitar o abuso de Direito e garantir a função social da propriedade. Aliás, esse é o próprio sentido do Direito do Trabalho: evitar abusos da classe patronal sobre os trabalhadores, garantindo um patamar mínimo civilizatório das condições de trabalho”.

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